segunda-feira, 2 de setembro de 2013

UM OLHAR PARA TRÁS VIII

Por Alberto David

Alberto David

Vida  atormentada

Saímos definitivamente da Rua Francisco Santos para um novo endereço,  já  mencionado   em textos anteriores,  dos infortúnios e as vicissitudes por que ali passamos .  Para se ter uma idéia,  o apartamento ficava nos fundos  e, para chegarmos até ele , tínhamos  de  seguir por um corredor . Além disso, éramos obrigados a  conviver com o mau cheiro e os insetos peçonhentos  e com  outros  considerados  inofensivos que vinham  da fossa  localizada no fundo do quintal.

Vivíamos ali,  três adultos, com três  crianças pequenas , numa  situação precária.

Com os cabelos compridos,  minha presença parecia ser motivo de vergonha e constrangimento para a família. O meu a atelier,  se é que posso chamá-lo assim , era um pequeno cômodo de poucos metros quadrados que não dava para movimentar-me, a não ser  um espaço para pôr o banco , o cavalete. Quando pintava, ficava  muito agitado, andando  de um lado para o outro a observar  uma melhor  perspectiva , uma posição melhor para ver as cores , uma melhor colocação dos elementos,  enfim, uma expressão que   deixasse  a obra de uma forma que me satisfizesse.  Ali pintei apenas dois trabalhos, em quase uma década,  pela falta de espaço. Preferi  dedicar-me aos desenhos  e depois houve alguns  problemas de saúde com o meu  filho, já do conhecimento dos leitores  destes textos , Um olhar para trás ;  mas, em compensação,  viria produzir com intensidade  na  próxima moradia .

Vem-me à lembrança “ A tragédia de minha vida “ , de Oscar Wilde,  que revela  uma escrita “desnuda”,   numa linguagem clara , e é assim que gosto de dizer,  de forma clara e verdadeira os  fatos da minha vida artística. Um percurso que não foi  fácil . Eu tive que percorrer  um longo caminho , tortuoso e agreste , tendo  uma pedra em cada curva  e adversidades, que me foram sucedendo a cada jornada. É  bem verdade que contei em minha travessia com importantes amigos  , minha mulher  e dentre eles o maior deles,  Jesus ,  que me amparou  nas descidas , nos trâmites de minha vida ingrata.

Por  volta de l996 , trabalhava ao lado do meu pai,  e era muito comum  colegas  meus passarem por mim e sorrirem dos macacões encharcados dos estrumes,  oriundos  das cargas do gado para o  abate  na região. Também  cheguei a trabalhar no posto de gasolina e, durante o abastecimento  dos caminhões a óleo diesel , acaba me sujando  e os  sujos de graxas e óleo diesel , naquele tempo usava o codinome de  bombeiro,  hoje é frentista. Ficava exposto a este vexame,  mas não ligava. Nas horas vagas desenhava  e escrevia meu pensamentos,  nunca fui preguiçoso,  sempre   dei porrada na  vida.. Trabalhava duro ali  ao lado de meu pai , diga-se  de  passagem, uma linda amizade,  mas que ia se deteriorar-se com  o tempo.  E  só voltaria ,após um longo  tempo …   Afastamo-nos  durante muitos  anos ,  tentei  de  todos os meios me reaproximar de meu pai , já quase na fase final  das crises, mas  sentia que me esquivava  , mesmo assim insistia,  queria o seu amor de volta , trocávamos algumas idéias,  não  era, porém,  como antes ,repito foi difícil , repito  sentia que  ele me evitava , por motivos óbvios , preocupado que viesse precisar de dinheiro,  eu era um artista muito pobre ; mas  não era nada disso, quem ia ali era meu coração,  Deus sabe disso,  e já deve ter falado com ele. Os que pensam ao contrário  não me importa, e, depois,  sabia que o  carma  que ora passava era meu .e tinha que perdoar.  E,  no final das contas,  dei a entender que , Graças a Deus,  era o afeto,  motivo  que o  procurava. Na  véspera de sua morte , Dia dos Pais,  lembro-me,  como se fosse hoje,  que , ao dar-lhe os parabéns,  disse a ele:  “ O senhor é um homem de valor “ e sorrindo respondeu-me:  “ Obrigado”.

Estava selada  a  amizade,  como nos   velhos tempo  de amigos  verdadeiros.

Naquele momento,  saiu   da sala e trouxe alguns documentos dentre os quais  um documento original da Prefeitura,   ou seja,  que dava  licença à  sepultamentos  e me disse:  “Fique com ele, Bertinho  (chamava-me assim), pode precisar e depois é difícil de procurar,  porque é tanta confusão  na hora  para  encontrar este papel “ . Eu fiquei atônico.  Peguei o documento e o guardei em casa, para cumprir  o  pedido.  Passados uns dois  dias , ele partiu , em paz e sem sofrimentos  inerentes à  partida, a  não ser uma única dor,  proveniente de um infarto fulminante.

Voltando a trajetória artística,  por volta de l980, estava na  fazenda Jaqueira , que  tanto   amamos  e onde vivenciamos  grandes momentos de nossas vidas, não estava bem , apesar de minha lucidez . Vim para Conquista,  para lançar  mais um livro,  “ O sonho de um guerreiro”, que, na verdade,  não fiz para este fim , quando o escrevi ,  o fiz  mais como terapia. Precisava pôr meus pensamentos em  ordem .  E,  daquela bendita  árvore,  uma enorme Jaqueira  que ficava ao lado da casa da sede da fazenda ,  comecei a pôr no papel  os  meus  pensamentos que  resultaram no livro, “O sonho de um  guerreio”. Deus foi muito generoso  comigo .

Antes dos anos 60,  meu pai fecha o posto de gasolina. Fiquei sem chão,   sem nada  para fazer,  gostaria de estar ali todos  os dias. Foi como seu eu tivesse perdido um ente querido, pois ocupava a minha mente,   que era muito fértil  ali. “E  agora José” ?

Acredito que daí,  a falta do trabalho foi o início de minha ruína ,  fiquei sem  rumo, gostava de ter compromissos, pois  nunca fui preguiçoso   e tinha como o hábito o trabalho . Parece que perdi  a direção.  E as coisas deram no que deram.  Com a mente vazia, sem minha  exposição permanente, que dava muito movimento,  foi   a  parte pior , pois era muito feliz  ali. O que fiz? Os leitores devem estar perguntando.  Fiz do meu quarto  de dormir um atelier improvisado,  coloquei  dois cavaletes e sobre eles uma rampa , tamanho em retângulo  e comecei a trabalhar, aliás,  tentei, pois minha mãe, não suportando a  bagunça,  chamou meu pai.

“Emilio,  você precisa conversar com Bertinho,  veja o que ele fez do quarto e mande-o tirar estas porcarias de lá”. O meu pai  via aquilo sem incômodo. Ele via aquilo, se acostumava e gostava de me ver  pintando; já diferente da minha  mãe, sabe como é dona de casa,   é dona da casa. Fiz o que ela quis,  porém pintei uma parede com um Cristo crucificado , que tomou a parede toda. Quando  ela o viu  quase cai de gosta , e logo chamou meu pai: “Emílio! Emílio! Veja o que Bertinho  fez aqui ?! “  Mas, para surpresa minha, o meu  pai gostou , o contrário de minha  mãe que achou um absurdo:   “ Este menino está doente!” , esbravejou.  No entanto, minha mãe gostava muito  de meus pensamentos e, de todos os meus poemas, ela tinha predileção pelo “O desespero do mendigo” , pois achava-o o mais bonito que um poeta pudesse escrever. Chegou a declamá-lo em vários lugares, a Academia Conquistense de Letras, pequenos seminários e centros espíritas. Sabia o poema todo de cor. Quanto aos outros, não tinha a mesma admiração, pois achava que nenhum deles era capaz de superar o “O desespero do mendigo”.

Então,  começaram os embates. Logo  após  “O  sonho de um guerreiro”,  meu pai começou a se opor a minha carreira : “ Como este rapaz pode se sustentar,  fazendo estas coisas ?  Viver de Filosofia!”,   dizia inconformado . Eu sempre fui diferente de meus irmãos que seguiram mais a orientação de meu pai, negociante,   sou o único artista da família, daí o baque.
Quanto aos meus livros,  milhares   e milhares de exemplares eram vendidos em mãos, pois as livrarias não gostavam de poetas da terra, e muito menos emergentes. Tinha que me virar  ,distribuía para as livrarias; outros colocava debaixo  do  braço e ia à luta, viajava pelas cidades circunvizinhas  para vendê-los aos prefeitos vizinhos.  Muitos  compravam  por amizade  ou  pela admiração “daquele esforço sem limite “.

Que exaustão. Não tinha mais o apoio de meu pai,  precisava  procurar patrocínios e outros amigos para me ajudar no meu sonho.

Fui  o único artista da família , a  levar uma vida  como um sacerdote,  sem as riquezas , sem o conforto material … E assim fui peregrinando pela vida  afora .

Com as crianças crescendo,  tive de mudar o meu  comportamento diante da vida , mas não a convicção de meus pensamentos e a  arte , ninguém vive sem ela. O dinheiro não é tudo.

Ali no posto,  sempre estava recebendo visitas de  pessoas de fora  e,  como disse anteriormente,  me distraía bastante , chamava a  atenção de todos  que por ali passavam , a exemplo do prof. Walter Levy, introdutor do expressionismo no Brasil , quando  aqui , de passagem por esta cidade estimulou-me para prosseguir   a carreira, convidando-me a estudar na Escola de Artes  Pan-americana,  em São Paulo, o quanto me arrependo de não ter ido para  lá.

Publiquei   13 livros, não obstante   as pessoas  não imaginam “o duro que dei “ para colocá-los nas livrarias , os projetos requeriam muito de mim e, daí,  vinham  as canseiras e os esgotamentos,  pois tudo era  comigo -  um polivalente. Realmente,  só vim ter prestígio   na minha terra após o meu sucesso lá fora , ainda assim , meu trabalho foi muito rejeitado,, sofria criticas  e restrições,  todas elas movidas  à “ nojenta “  da inveja , parece um carma na minha vida.

Dentre os amigos que me ajudaram nesta fase tomando a minha dor,  cito as palavras de Nilton Gonçalves representando os demais:  “ têm – se manifestado contra a inclusão do poeta e artista Alberto David ; um poeta e artista , que tem sido apoiado lá fora especialmente em Salvador , tem dado entrevistas  em jornais , emissoras de rádio e TV e indiretamente tem procurado elevar o nome no tocante ao setor  cultural (…). Quantos desses filhos de vocação, famosos e inteligentes , em vida contribuíram para eleger esta cidade. Vitória da Conquista , como cidade próspera , mas que recebeu a negligência para com suas memórias”.

Voltando às coisas práticas da vida,  morávamos mal ali na Francisco Santos. Precisávamos sair dali,  urgentemente , havia  focos de escorpiões ,   minha mulher estava grávida, dessa vez de uma menina . Todos avisavam ,  inclusive o meu  pai,   até que um dia a  minha mulher foi picada por  um deles,  só assim , saímos  daquele inferno , indo para uma outra casa, na Rua  Ascendino  Melo – 23 , pelo menos a casa tinha frente e, das janelas,  podíamos  ver o céu,  o sol e o movimento da rua.

Minha batalha era grande,  ainda por cima , tinha as tarefas de pai com direito a todas as preocupações e mais por ser um artista .

A nova casa  tinha apenas  oitenta metros quadrados,  num formato de um polígono . Vivíamos ali : eu , minha mulher  e, agora, quatro filhos , dentre eles  Sarah, uma linda criança, no meio daquele turbilhão, ou melhor dizendo, dentro de uma lata de sardinha. Numa vida bastante miserável.

Lá moramos   uns  quinze anos. Hoje a  casa nem existe mais, foi  demolida .Ainda bem.

Em l986 sou convidado fazer  parte da equipe de funcionários do Centro de Cultura.

Saímos definitivamente da Rua Francisco Santos para um novo endereço,  já  mencionado   em textos anteriores,  dos infortúnios e as vicissitudes por que ali passamos .  Para se ter uma idéia,  o apartamento ficava nos fundos  e, para chegarmos até ele , tínhamos  de  seguir por um corredor . Além disso, éramos obrigados a  conviver com o mau cheiro e os insetos peçonhentos  e com  outros  considerados  inofensivos que vinham  da fossa  localizada no fundo do quintal.

Vivíamos ali,  três adultos, com três  crianças pequenas , numa  situação precária.

Com os cabelos compridos,  minha presença parecia ser motivo de vergonha e constrangimento para a família. O meu a atelier,  se é que posso chamá-lo assim , era um pequeno cômodo de poucos metros quadrados que não dava para movimentar-me, a não ser  um espaço para pôr o banco , o cavalete. Quando pintava, ficava  muito agitado, andando  de um lado para o outro a observar  uma melhor  perspectiva , uma posição melhor para ver as cores , uma melhor colocação dos elementos,  enfim, uma expressão que   deixasse  a obra de uma forma que me satisfizesse.  Ali pintei apenas dois trabalhos, em quase uma década,  pela falta de espaço. Preferi  dedicar-me aos desenhos  e depois houve alguns  problemas de saúde com o meu  filho, já do conhecimento dos leitores  destes textos , Um olhar para trás ;  mas, em compensação,  viria produzir com intensidade  na  próxima moradia .

Vem-me à lembrança “ A tragédia de minha vida “ , de Oscar Wilde,  que revela  uma escrita “desnuda”,   numa linguagem clara , e é assim que gosto de dizer,  de forma clara e verdadeira os  fatos da minha vida artística. Um percurso que não foi  fácil . Eu tive que percorrer  um longo caminho , tortuoso e agreste , tendo  uma pedra em cada curva  e adversidades, que me foram sucedendo a cada jornada. É  bem verdade que contei em minha travessia com importantes amigos  , minha mulher  e dentre eles o maior deles,  Jesus ,  que me amparou  nas descidas , nos trâmites de minha vida ingrata.

Por  volta de l996 , trabalhava ao lado do meu pai,  e era muito comum  colegas  meus passarem por mim e sorrirem dos macacões encharcados dos estrumes,  oriundos  das cargas do gado para o  abate  na região. Também  cheguei a trabalhar no posto de gasolina e, durante o abastecimento  dos caminhões a óleo diesel , acaba me sujando  e os  sujos de graxas e óleo diesel , naquele tempo usava o codinome de  bombeiro,  hoje é frentista. Ficava exposto a este vexame,  mas não ligava. Nas horas vagas desenhava  e escrevia meu pensamentos,  nunca fui preguiçoso,  sempre   dei porrada na  vida.. Trabalhava duro ali  ao lado de meu pai , diga-se  de  passagem, uma linda amizade,  mas que ia se deteriorar-se com  o tempo.  E  só voltaria ,após um longo  tempo …   Afastamo-nos  durante muitos  anos ,  tentei  de  todos os meios me reaproximar de meu pai , já quase na fase final  das crises, mas  sentia que me esquivava  , mesmo assim insistia,  queria o seu amor de volta , trocávamos algumas idéias,  não  era, porém,  como antes ,repito foi difícil , repito  sentia que  ele me evitava , por motivos óbvios , preocupado que viesse precisar de dinheiro,  eu era um artista muito pobre ; mas  não era nada disso, quem ia ali era meu coração,  Deus sabe disso,  e já deve ter falado com ele. Os que pensam ao contrário  não me importa, e, depois,  sabia que o  carma  que ora passava era meu .e tinha que perdoar.  E,  no final das contas,  dei a entender que , Graças a Deus,  era o afeto,  motivo  que o  procurava. Na  véspera de sua morte , Dia dos Pais,  lembro-me,  como se fosse hoje,  que , ao dar-lhe os parabéns,  disse a ele:  “ O senhor é um homem de valor “ e sorrindo respondeu-me:  “ Obrigado”.

Estava selada  a  amizade,  como nos   velhos tempo  de amigos  verdadeiros.

Naquele momento,  saiu   da sala e trouxe alguns documentos dentre os quais  um documento original da Prefeitura,   ou seja,  que dava  licença à  sepultamentos  e me disse:  “Fique com ele, Bertinho  (chamava-me assim), pode precisar e depois é difícil de procurar,  porque é tanta confusão  na hora  para  encontrar este papel “ . Eu fiquei atônico.  Peguei o documento e o guardei em casa, para cumprir  o  pedido.  Passados uns dois  dias , ele partiu , em paz e sem sofrimentos  inerentes à  partida, a  não ser uma única dor,  proveniente de um infarto fulminante.

Voltando a trajetória artística,  por volta de l980, estava na  fazenda Jaqueira , que  tanto   amamos  e onde vivenciamos  grandes momentos de nossas vidas, não estava bem , apesar de minha lucidez . Vim para Conquista,  para lançar  mais um livro,  “ O sonho de um guerreiro”, que, na verdade,  não fiz para este fim , quando o escrevi ,  o fiz  mais como terapia. Precisava pôr meus pensamentos em  ordem .  E,  daquela bendita  árvore,  uma enorme Jaqueira  que ficava ao lado da casa da sede da fazenda ,  comecei a pôr no papel  os  meus  pensamentos que  resultaram no livro, “O sonho de um  guerreio”. Deus foi muito generoso  comigo .

Antes dos anos 60,  meu pai fecha o posto de gasolina. Fiquei sem chão,   sem nada  para fazer,  gostaria de estar ali todos  os dias. Foi como seu eu tivesse perdido um ente querido, pois ocupava a minha mente,   que era muito fértil  ali. “E  agora José” ?

Acredito que daí,  a falta do trabalho foi o início de minha ruína ,  fiquei sem  rumo, gostava de ter compromissos, pois  nunca fui preguiçoso   e tinha como o hábito o trabalho . Parece que perdi  a direção.  E as coisas deram no que deram.  Com a mente vazia, sem minha  exposição permanente, que dava muito movimento,  foi   a  parte pior , pois era muito feliz  ali. O que fiz? Os leitores devem estar perguntando.  Fiz do meu quarto  de dormir um atelier improvisado,  coloquei  dois cavaletes e sobre eles uma rampa , tamanho em retângulo  e comecei a trabalhar, aliás,  tentei, pois minha mãe, não suportando a  bagunça,  chamou meu pai.

“Emilio,  você precisa conversar com Bertinho,  veja o que ele fez do quarto e mande-o tirar estas porcarias de lá”. O meu pai  via aquilo sem incômodo. Ele via aquilo, se acostumava e gostava de me ver  pintando; já diferente da minha  mãe, sabe como é dona de casa,   é dona da casa. Fiz o que ela quis,  porém pintei uma parede com um Cristo crucificado , que tomou a parede toda. Quando  ela o viu  quase cai de gosta , e logo chamou meu pai: “Emílio! Emílio! Veja o que Bertinho  fez aqui ?! “  Mas, para surpresa minha, o meu  pai gostou , o contrário de minha  mãe que achou um absurdo:   “ Este menino está doente!” , esbravejou.  No entanto, minha mãe gostava muito  de meus pensamentos e, de todos os meus poemas, ela tinha predileção pelo “O desespero do mendigo” , pois achava-o o mais bonito que um poeta pudesse escrever. Chegou a declamá-lo em vários lugares, a Academia Conquistense de Letras, pequenos seminários e centros espíritas. Sabia o poema todo de cor. Quanto aos outros, não tinha a mesma admiração, pois achava que nenhum deles era capaz de superar o “O desespero do mendigo”.

Então,  começaram os embates. Logo  após  “O  sonho de um guerreiro”,  meu pai começou a se opor a minha carreira : “ Como este rapaz pode se sustentar,  fazendo estas coisas ?  Viver de Filosofia!”,   dizia inconformado . Eu sempre fui diferente de meus irmãos que seguiram mais a orientação de meu pai, negociante,   sou o único artista da família, daí o baque.
Quanto aos meus livros,  milhares   e milhares de exemplares eram vendidos em mãos, pois as livrarias não gostavam de poetas da terra, e muito menos emergentes. Tinha que me virar  ,distribuía para as livrarias; outros colocava debaixo  do  braço e ia à luta, viajava pelas cidades circunvizinhas  para vendê-los aos prefeitos vizinhos.  Muitos  compravam  por amizade  ou  pela admiração “daquele esforço sem limite “.

Que exaustão. Não tinha mais o apoio de meu pai,  precisava  procurar patrocínios e outros amigos para me ajudar no meu sonho.

Fui  o único artista da família , a  levar uma vida  como um sacerdote,  sem as riquezas , sem o conforto material … E assim fui peregrinando pela vida  afora .

Com as crianças crescendo,  tive de mudar o meu  comportamento diante da vida , mas não a convicção de meus pensamentos e a  arte , ninguém vive sem ela. O dinheiro não é tudo.

Ali no posto,  sempre estava recebendo visitas de  pessoas de fora  e,  como disse anteriormente,  me distraía bastante , chamava a  atenção de todos  que por ali passavam , a exemplo do prof. Walter Levy, introdutor do expressionismo no Brasil , quando  aqui , de passagem por esta cidade estimulou-me para prosseguir   a carreira, convidando-me a estudar na Escola de Artes  Pan-americana,  em São Paulo, o quanto me arrependo de não ter ido para  lá.

Publiquei   13 livros, não obstante   as pessoas  não imaginam “o duro que dei “ para colocá-los nas livrarias , os projetos requeriam muito de mim e, daí,  vinham  as canseiras e os esgotamentos,  pois tudo era  comigo -  um polivalente. Realmente,  só vim ter prestígio   na minha terra após o meu sucesso lá fora , ainda assim , meu trabalho foi muito rejeitado,, sofria criticas  e restrições,  todas elas movidas  à “ nojenta “  da inveja , parece um carma na minha vida.

Dentre os amigos que me ajudaram nesta fase tomando a minha dor,  cito as palavras de Nilton Gonçalves representando os demais:  “ têm – se manifestado contra a inclusão do poeta e artista Alberto David ; um poeta e artista , que tem sido apoiado lá fora especialmente em Salvador , tem dado entrevistas  em jornais , emissoras de rádio e TV e indiretamente tem procurado elevar o nome no tocante ao setor  cultural (…). Quantos desses filhos de vocação, famosos e inteligentes , em vida contribuíram para eleger esta cidade. Vitória da Conquista , como cidade próspera , mas que recebeu a negligência para com suas memórias”.

Voltando às coisas práticas da vida,  morávamos mal ali na Francisco Santos. Precisávamos sair dali,  urgentemente , havia  focos de escorpiões ,   minha mulher estava grávida, dessa vez de uma menina . Todos avisavam ,  inclusive o meu  pai,   até que um dia a  minha mulher foi picada por  um deles,  só assim , saímos  daquele inferno , indo para uma outra casa, na Rua  Ascendino  Melo – 23 , pelo menos a casa tinha frente e, das janelas,  podíamos  ver o céu,  o sol e o movimento da rua.

Minha batalha era grande,  ainda por cima , tinha as tarefas de pai com direito a todas as preocupações e mais por ser um artista .

A nova casa  tinha apenas  oitenta metros quadrados,  num formato de um polígono . Vivíamos ali : eu , minha mulher  e, agora, quatro filhos , dentre eles  Sarah, uma linda criança, no meio daquele turbilhão, ou melhor dizendo, dentro de uma lata de sardinha. Numa vida bastante miserável.

Lá moramos   uns  quinze anos. Hoje a  casa nem existe mais, foi  demolida .Ainda bem.

Em l986 sou convidado fazer  parte da equipe de funcionários do Centro de Cultura.

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