Os livros não são somente inspiração para a teledramaturgia, seja nas
adaptações ou citações. Muitas vezes, eles aparecem mesmo em cena,
fazendo mera figuração, como uma dica de leitura para o telespectador ou
até mesmo um recado do autor. João Emanuel Carneiro, no ar com Avenida Brasil, gosta do recurso e está sempre pondo seus personagens para ler – a Flora (Patrícia Pillar) de A Favorita
(2008), por exemplo, teve bastante tempo para leitura nos 18 anos que
passou na prisão. Por isso, era uma vilã culta, cheia de teatralidades e
tão ardilosa.
Na atual novela das 21h, o autor dá livros a quem mais precisa: Tufão
(Murilo Benício), que se diverte com as histórias sugeridas por Nina
(Débora Falabella). Até agora foram A Metamorfose, de Franz Kafka, e Madame Bovary,
de Gustave Flaubert, certamente duas tentativas da heroína de azeitar
os neurônios do ex-craque do Divino Futebol Clube. Como o protagonista
da novela de Kafka, Tufão sustenta uma família numerosa, que se
acostumou a viver cercada de luxos graças ao seu trabalho. Espera-se que
ele acorde um dia, como acordou Gregor Samsa – acordar para a vida e
não como uma barata, claro. Carminha (Adriana Esteves) não chega a ser
uma Emma Bovary, mas o caso de adultério do livro de Flaubert serviu
como mensagem subliminar de Nina para o patrão. A piada é que se ele não
consegue perceber as escapadas da mulher com o cunhado Max (Marcello
Novaes) dentro da própria casa, imagine se terá perspicácia suficiente
para se perceber um Charles Bovary. Não custa tentar.
Mãe Lucinda (Vera Holtz) também apareceu lendo Alice no País das Maravilhas,
de Lewis Caroll, para as crianças do lixão, em cena muito graciosa. Mas
usar a novela como vitrine não é exclusividade de João Emanuel, é algo
presente na obra de quase todos os autores, como Manoel Carlos, Silvio
de Abreu, Maria Adelaide Amaral, Walcyr Carrasco e Gilberto Braga. Deste
último, podemos citar a personagem Norma (Glória Pires), de Insensato Coração(2010),
que como Flora, aproveitou o tempo na cadeia para pôr a leitura em dia e
arquitetar sua vingança contra Léo (Gabriel Braga Nunes), seu ex-amor
traidor.
Entre os livros que apareceram na sua cela – como Crime e Castigo, de Dostoiévski, e O Vermelho e o Negro, de Stendhal –, o que mais chamou a atenção do público foi o best-seller O Outro Lado da Meia-Noite,
de Sidney Sheldon. Na época, ele esteve em destaque na lista dos itens
mais pedidos da Central de Atendimento ao Telespectador (CAT) da Globo,
entre os batons mais desejados e vestidos mais bonitos da temporada.
Outro que também aproveitou a prisão para crescer intelectualmente foi o
Herculano Quintanilha (Rodrigo Lombardi), do remake de O Astro
(2011). Teve como mentor Ferragus (Francisco Cuoco), detento muito
misterioso que o introduziu no ilusionismo e na arte da oratória – uma
verdadeira universidade, sem sair da cela.
Mais do que leitores eventuais, há ainda os personagens que vivem no mundo da literatura. Miguel (Tony Ramos) era livreiro em Laços de Família
(2000), de Manoel Carlos, com loja no Leblon, por onde passava boa
parte do elenco da novela. Pedro (Bruno Garcia), da minissérie Queridos Amigos,
de Maria Adelaide Amaral, era um escritor um tanto perturbado e em
crise de criatividade. Sobre ele, uma curiosidade: os livros do cenário –
títulos de escritores como Pablo Neruda, Eduardo Galeano e Gabriel
García Márquez, entre outros – foram escolhidos pela própria autora.
FONTE: Veja Por
Patrícia Villalba
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