sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Deixar que Yoani seja atacada e calada é ser conivente com crime

Gilberto Carvalho prometeu: “Em 2013, o bicho vai pegar!” Hoje, eles só nos xingam; Amanhã, começarão a nos espancar. E certo jornalismo dirá: “Normal! Lado e outro lado! O lado que bate e o lado que apanha. É a democracia!”

Por Reinaldo Azevedo

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Está em curso uma evidente degradação da democracia brasileira — e, com ele, estão em pleno naufrágio setores importantes da imprensa. É espantosa a quantidade de barbaridades que se leem, veem e ouvem quando cotejadas com os fundamentos de uma sociedade democrática. Desde que me interesso por isso — comecei a ler jornais aos 14 anos —, não me lembro de nada parecido. Já vou tratar da questão de fundo. Vamos ao fato que me empurrou para ele. Ontem, no fim da tarde e começo da noite, a blogueira cubana Yoani Sánchez deveria ter feito um bate-papo com blogueiros na Livraria Cultura da Paulista, em São Paulo, mediado pela jornalista Barbara Gancia, e depois autografar exemplares do livro “De Cuba, com carinho”. Mais uma vez, o evento se frustrou.

Lá estavam os militantes do PC do B, do PT e afins para impedi-la de falar. O evento teve de ser cancelado pela simples e óbvia razão de que os brucutus não a deixavam falar. Um dos idiotas que babavam levantou um cartaz: “Cuba, único país com vacina contra o câncer”. Deve ser aquela que foi ministrada a Hugo Chávez… É com esse tipo de imbecis que estamos lidando. A embaixada de Cuba em Brasília deve estar satisfeita. O funcionário de Gilberto Carvalho deve estar satisfeito. O próprio Gilberto Carvalho deve estar satisfeitíssimo. Desta vez, o PT não devolveu a Fidel Castro, como fez em 2007, dois dissidentes cubanos. Desta feita, uma crítica do regime cubano foi agredida aqui mesmo. É claro que as pessoas responsáveis pela passagem de Yoani pelo Brasil merecem o troféu “Incompetentes do Ano” — e talvez seja coisa ainda pior do que incompetência; já chego lá. Quero me ater agora à imprensa.

Ando com a impressão de que, com as exceções de sempre, desapareceu dos jornais, sites, revistas etc. a figura do editor. O que faz um editor — sem que isso deixe de ser, também, tarefa do repórter? Zela pela qualidade da informação, pelo rigor da apuração jornalística e, é evidente!, pela linha editorial do veículo no qual trabalha. “Que linha editorial é essa?” Cada um tem — e deve ter — a sua. No geral, os veículos da grande imprensa, incluindo as TVs, estão comprometidos, ao menos dos seus princípios declarados, com o regime democrático, a pluralidade, a economia de mercado, os direitos individuais, essas coisas. Mas podem ser, e são, infiltrados. Quantas vezes, na minha vida de editor, recusei reportagens que estavam nitidamente pautadas por lobbies ideológicos! Na maioria das vezes, não se tratava de má-fé do repórter. É que as esquerdas são muito hábeis em mobilizar jornalistas. Por quê? Porque sabem mexer com seu senso de “justiça social”. Cabia ao editor corrigir rumos. Hoje… Parece que vivemos o tempo do “escreveu, publicou”, pouco importa o quê. A principal degradação é de valores.

Voltemos a Yoani. Cansei de ver nas TVs e de ler em jornais e sites que as manifestações têm dois lados: os que são contra a blogueira e os que são a favor dela, mais ou menos como forças legítimas e iguais, porém de sinal trocado, que se expressam democraticamente. Alto lá! As coisas não são assim! Eis a degradação de valores. Eis a degradação da democracia. Apoiar alguém que tem o direito de falar e impedir o exercício desse direito não são posturas análogas opostas.

Não é legítimo nem legal impedir que o outro fale. Ao contrário: trata-se de um constrangimento previsto no Código Penal e de uma afronta ao Artigo V da Constituição brasileira. Tolerar que arruaceiros, que baderneiros, que brucutus, que vigaristas impeçam o exercício de um direito é ser conivente com uma crime. Uma coisa é eventualmente discordar de Yoani; outra, distinta, é impedi-la de falar. Eu os convido a ler com atenção algumas notícias. Eu os convido a ficar atentos a certas abordagens dos noticiários de TV.

Não estamos diante de uma partida de futebol, em que é legítimo que os dois lados disputem a bola. Mesmo assim, só existe jogo porque há regras — ou os contendores sairiam na porrada, não é? E há juiz para aplicá-las. E todos reconhecem a sua autoridade. Nesse caso, um dos lados não tem legitimidade nenhuma porque seu objetivo é impedir a partida.

Desordem

Quem quer que tenha cuidado da agenda de Yoani no Brasil — e espero que ela tenha mais sorte nos demais países; certamente terá — cometeu uma série de erros e mesmo de desatinos, especialmente depois que VEJA noticiou, já desde a manhã de sábado, que uma súcia, com apoio objetivo de um auxiliar de Gilberto Carvalho, estava organizando a baderna.

A blogueira cubana jamais deveria ter sido exposta à agressão desse bando. Os mecanismos que fazem do Brasil uma democracia de direito deveriam ter sido acionados para assegurar a ela o direito de falar. Afinal, era evidente que vagabundos que defendem corruptos, ladrões, peculatários e quadrilheiros se organizassem para constranger pessoas de bem. Em parte, isso se explica porque houve um esforço para despolitizar a figura da blogueira cubana, tentando fazer dela alguém também palatável às esquerdas — daí o fato de o senador Eduardo Suplicy aparecer como um cicerone. Acontece que os nossos “cubaneiros”, bucaneiros da ideologia, não têm certas sutilezas.

A vacina contra o câncer — este realmente sem cura — da intolerância é a imposição da lei.

Como disse o professor Marco Antonio Villa num e-mail que me enviou, Gilberto Carvalho está cumprindo uma promessa. E o ministro prometeu: “Em 2013, o bicho vai pegar”. Hoje, eles apenas nos xingam. Amanhã, começam a nos espancar. E é bem capaz de certo jornalismo noticiar tudo na base do “lado” e “outro lado”, o lado que bate e o lado que apanha… Tudo coisa da democracia…

FONTE: VEJA

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