sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Em algum lugar no céu

Por Alberto David

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Meus olhos ultimamente andavam secos e duros como as pedras que não choram. Desde a perda de um meu animalzinho de estimação, de prenome Karol que, como se não bastasse sua perda, ainda prestes a morrer deixou-me os filhotes para que cuidasse deles. A cachorrinha partiu logo após a amamentação dos bichinhos, foi o seu “último pedido” que no olhar clamava ali dentro da cestinha da clínica.

De tanto chorar minhas lágrimas secaram! E, de súbito, quando levei minhas mãos até o rosto, não havia percebido, vi minhas mãos molhadas, vi lágrimas caindo de mansinho sobre o meu rosto, que agora eram só lágrimas. E eu que tinha tanta necessidade chorar, como recomendam os oftalmologistas.

Não queria que fosse assim. Jamais. Talvez por uma lembrança feliz, uma alegria presente , uma conquista na carreira etc.

Era Zila quem partia !

Mas o fardo que ora passava permitiu que fosse assim. O fardo chegou ao limite. Era preciso estancar a dor, o sofrimento, a sua prova cumprida ao último centil, como uma foice afiada que bate ao roçar o mato e que bate no espinheiro, arrancando de uma vez só os espinhos, mesmo que o outro lado da foice pega em nossos corações e parte ao meio. Era necessário.

Teu fardo Mãe, nunca foi leve.

Uma parte de você era alegre, extrovertida e aonde chegava era o centro das atenções. Outra parte, tristonha como a penumbra, à meia luz, às vezes à procura da solidão. Envolta com os seus pensamentos, foi a melancolia.

Hoje, em minha vida, só vivo de suas lembranças...

Da garota mais bela que já se viu pelas plagas de sua cidade natal, Jacaracy. Das suas indumentárias floridas, dos brincos, identidade já sua – “ este brinco parece com mãe “, do batom forte , do pó de arroz , dos permanentes que deixavam seus cabelos anelados, da sua penteadeira e sua beleza espelhada.

Das suas estripulias, que a levou ao título de a mais cobiçada dos rapazes Jacarienses.

Da primeira motorista em Conquista; das primeiras mulheres a conduzir bicicleta nesta terra, então coronelista, pioneira das calças compridas. Da fama carinhosamente referida entre suas amigas: “Zila é muito doida “ , fama que puxei !

Mas o tempo foi passando...

Das intempéries.

Dos seus tombos, quedas, da sua mandíbula quebrada que machucou à sua beleza, quando cuidava de suas flores.

Da perda do companheiro.

Do acidente que tombou à beira do passeio vizinho: tudo isso a impedia de ser feliz e muito mais.

Mas sempre estava ali, pondo o seu batom, o pó de arroz, escovando os cabelos, mesmo para camuflar as tristezas da trajetória...

Nunca desistiu de viver por mais que a melancolia batesse forte como um coice de cavalo.

Lembrei-me dos doces de marmelos, do arroz de pequi, das suas saborosas sopas. Do menino correndo da sandália em sua mão e correndo para seu abraço

Da sua preocupação quanto ao meu futuro.

Da sua generosidade aos menos favorecidos. Nestes anos todos, de sua vida, nunca vi alguém lhe pedir uma esmola e ser negada.

Da sua prece de Cáritas, pela sua emoção, ao orar, emocionando a todos.

Agora ali todos os seus amigos e amigas - as duas filhas adotivas que a senhora criou estavam lá presentes.

Todos atônitos?

Ante à sua beleza de moça de Jacaracy, como um milagre diziam:“ Zila está linda como nos tempos de jacaracy”.

Agora todos ali. Seus amigos cantavam canções de Roberto Carlos, aquelas que a Senhora na varanda da casa velha gostava de entoar, aplaudida...deixando passar a todos os presentes, além dos seus traços belos e firmes, um sorrisinho aos amigos, como se quisesse dizer: OBRIGADA!

Em tempo, ia esquecendo, Mãe, do seu cachorrinho "Nike", que lhe acompanhou estes últimos l4 anos e a Senhora teve de deixá-lo aqui, está bem, alegre e feliz. Estou cuidando dele como um filho.

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